Diante da instabilidade que tem afetado o mercado de criptomoedas nas últimas semanas, pode parecer que todo o setor está enfrentando dificuldades. No entanto, a situação é mais intricada do que parece. No que diz respeito às stablecoins, a semana se mostra crucial, pois o Senado dos Estados Unidos está prestes a votar uma regulação para esse segmento.
A proposta está pronta para ser discutida no Comitê Bancário do Senado, contando com apoio de ambos os partidos, e a votação da versão atualizada do projeto está agendada para quinta-feira (13).
“Uma regulamentação clara e que leve em consideração os riscos — com ênfase na transparência dos emissores e nos requisitos de reserva — poderia conferir legitimidade às stablecoins, atraindo investimentos institucionais e acelerando sua adoção”, afirmou Hong NG, diretor jurídico da Bitget.
Stablecoins são moedas digitais que mantêm um valor constante, geralmente atreladas a ativos como o dólar ou o euro.
Nos Estados Unidos, esses ativos ganharam destaque durante a administração de Donald Trump, que se opõe às moedas digitais emitidas por bancos centrais (CBDCs, na sigla em inglês).
Teoricamente, as CBDCs têm o potencial de modernizar o sistema financeiro, oferecendo maior agilidade, eficiência e segurança. No entanto, Trump e seus apoiadores consideram essas moedas uma ameaça à privacidade dos cidadãos e um risco para a estabilidade do sistema bancário.
Uma das principais preocupações é o controle. Como as CBDCs são emitidas diretamente por instituições governamentais e bancos centrais, críticos temem que possam se transformar em instrumentos de vigilância financeira, facilitando a apreensão de economias e até mesmo a censura de transações.
Em resposta a essas preocupações, uma das primeiras ordens executivas do presidente norte-americano foi a proibição ao Federal Reserve (o banco central dos EUA) de desenvolver sua própria moeda digital.
É nesse contexto que as stablecoins, especialmente aquelas lastreadas no dólar, ganham destaque. Elas atuam como uma espécie de “dólar digital” descentralizado, ocupando o espaço deixado pela decisão de Trump.
“Ao priorizar as stablecoins do setor privado em vez de uma CBDC governamental, os EUA adotam uma abordagem semelhante à da Suíça, promovendo um ambiente competitivo. No entanto, isso pode levar a uma perda de competitividade em relação a regiões que estão avançando com moedas digitais estatais, como o yuan digital da China e o euro digital na Europa”, destacou Hong NG.
Além das questões políticas, um desafio técnico significativo para as CBDCs é a falta de interoperabilidade. Cada país desenvolve sua própria tecnologia, o que dificulta a comunicação entre diferentes moedas digitais.
Stablecoins: O Dólar Digital dos EUA
Nesse cenário, o mercado de stablecoins — que já era imenso, movimentando mais de US$ 15 trilhões em transações globais em 2024, conforme dados da ARK Invest — continua a se expandir.
“As stablecoins representam cerca de 70% dos pares de negociação de criptomoedas e desempenham um papel fundamental nas liquidações contínuas e nas transações internacionais, reforçando sua importância no sistema financeiro”, revelou o diretor jurídico.
Fontes consultadas pelo Money Times indicam que a nova administração dos EUA tem dois objetivos principais:
- Fomentar o mercado privado de criptomoedas, incentivando o desenvolvimento de novos projetos e mantendo os entusiastas do setor engajados com Trump.
- Aumentar a demanda pelo dólar e pelos títulos da dívida americana, solidificando a posição dos EUA no ambiente digital.
Atualmente, as stablecoins são amplamente reconhecidas como referência internacional. As duas maiores do mundo, Tether (USDT) e USD Coin (USDC), movimentam bilhões de dólares todos os dias. O USDT é emitido pela Tether, que divulga relatórios sobre suas reservas, incluindo dólares, títulos da dívida e outros ativos relacionados ao Tesouro dos EUA. Por outro lado, o USDC é emitido pela Circle em colaboração com a Coinbase, uma empresa pública nos EUA sujeita a rigorosos padrões de governança corporativa.
Enquanto isso, na sala da justiça…
A disputa entre o presidente Lula e Trump não passa despercebida. Com as recentes mudanças na política econômica dos Estados Unidos e suas consequências para o comércio global, Lula está se mostrando disposto a agir no âmbito diplomático.
De acordo com uma reportagem do Globo, publicada nesta quarta-feira (12), o presidente brasileiro planeja utilizar a presidência rotativa do Brics para promover transações financeiras internacionais entre os países membros, empregando a tecnologia blockchain, que é a base das criptomoedas.
O Brics, atualmente composto por Brasil, Índia, China, Rússia, África do Sul, além de novos integrantes como Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Irã e Indonésia, já debate há algum tempo maneiras de aumentar a eficiência nos contratos de importação e exportação e diminuir os custos nas transações entre as nações. A proposta de criar uma moeda própria, que substituiria o dólar — seja ela digital ou física — enfrenta resistência por parte dos EUA, que já sinalizou a possibilidade de impor uma taxa de 100% ao bloco caso essa ideia avance.
Em contraste com a abordagem americana, o Brasil está em processo de desenvolvimento de sua própria moeda digital centralizada (CBDC), chamada Drex. Essa moeda já está em fase de testes e pode ser lançada ainda em 2025.
Outros blocos econômicos estão seguindo por um caminho semelhante. Na segunda-feira (10), Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu, anunciou que o euro digital deve ser lançado até outubro deste ano.