Liminares concedidas pela Justiça nas últimas semanas estão permitindo que empresas mantenham benefícios fiscais que seriam limitados com a regulamentação das subvenções, impondo derrota para o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em uma de suas principais medidas na busca pelo déficit fiscal zero neste ano.

Ao menos três decisões liminares, em diferentes estados, foram expedidas pelo Judiciário em favor de empresas e representantes de setores que não concordam com o entendimento do governo e buscam evitar o pagamento de tributos federais envolvidos na medida.

A MP das subvenções foi sancionada em dezembro, após meses de negociações, e tem impacto estimado em R$ 35 bilhões só em 2024, segundo o governo. O texto limita a investimentos de empresas os benefícios fiscais federais baseados em incentivos estaduais, o que na prática proíbe a extensão desses subsídios para gastos com custeio das companhias.

A adoção da medida pelo governo foi alvo de questionamentos de setores empresariais, que alegavam haver afronta ao pacto federativo, porque a Receita Federal estaria limitando um benefício originado em decisões de governos regionais. Ações também questionam a abrangência da trava imposta pelo governo.

Em um dos processos, aberto em São Paulo pela Laticínios Catupiry, a empresa alegou que tem direito a créditos presumidos do imposto estadual ICMS — redução tributária baseada em operações feitas pela companhia — e que esse incentivo não pode ser incluído no cálculo de Imposto de Renda (IRPJ) e Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) porque os benefícios “não constituem renda”.

“Em razão do princípio federativo, a tributação pela União sobre os créditos presumidos derivados de políticas fiscais e desenvolvimentistas de estados implicaria no desrespeito à autonomia deste ente”, diz a companhia na ação. O pedido foi acatado de forma liminar na última terça-feira pela Justiça Federal, que determinou a suspensão da incidência de IRPJ e CSLL sobre os créditos presumidos de ICMS da empresa.

Decisão similar foi proferida neste mês em Brasília, em favor do Sindicado do Comércio Atacadista do Distrito Federal. Nesse caso, o benefício de ICMS não entrará na base de cálculo de PIS e Cofins.

Procurado, o Ministério da Fazenda afirmou que receitas decorrentes de subvenções sempre integraram a receita bruta das empresas e estiveram sujeitas à tributação federal e que a pasta “se consagrará vencedora nas ações que tratam do tema”. “Quando um benefício fiscal é concedido por estado ou Distrito Federal, não deve ser compulsoriamente replicado pela União Federal em tributos de sua competência privativa, sob pena de ofensa ao princípio federativo”, afirmou a Fazenda.

O economista-chefe e sócio da Warren Investimentos, Felipe Salto, avaliou que a judicialização era esperada, mas considerou a nova lei “bastante clara” ao definir que “benefício fiscal do ICMS, não importa de que tipo, deve ser tratado como um crédito e, como tal, está sujeito à tributação federal, devendo passar por avaliação, caso a caso, da Receita”.

Para Salto, que já previa anteriormente um ganho menor que o previsto pelo governo com a medida, se o tema escalar ao Supremo Tribunal Federal (STF), “a coisa deve caminhar bem rápido, até porque a consequência fiscal e econômica é enorme”. “A judicialização, no limite, será uma pedra no caminho, mas não acho que terá o condão de evitar a ação da Receita no sentido de buscar a arrecadação perdida”.

Clarissa Machado, sócia da área tributária do escritório Trench Rossi Watanabe, que atua em ações envolvendo o assunto, afirmou que as liminares são uma boa notícia para os contribuintes, pois confirmam que o pacto federativo prevalecerá. “Os créditos presumidos são créditos não recuperáveis, que o governo estadual abdicou de receber e que o governo federal, por sua vez, não pode tributar”.

O Trench Rossi Watanabe ressaltou que o STF deverá julgar em breve uma ação que trata especificamente da tributação de créditos presumidos, podendo firmar um entendimento geral sobre o tema.

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