Juno captura sombra da lua em Júpiter

Imagem de Júpiter tirada pela espaçonave Juno da NASA em fevereiro de 2022. A mancha escura é a sombra da lua Ganimedes. Os padrões coloridos são formados por nuvens em diferentes altitudes e compostos principalmente de gelo de amônia, hidrossulfeto de amônio e água. Crédito: NASA/JPL-Caltech/SwRI/MSSS, Processamento de imagem por Thomas Thomopoulos © CC BY

Pela primeira vez, uma ferramenta projetada para descobrir planetas a muitos anos-luz de distância foi empregada em um objeto do Sistema Solar, em um estudo sobre Júpiteros ventos.

Encontramo-nos numa altura em que se tornou quase comum descobrir planetas orbitando outra estrela, com mais de 5.000 já registados. Os primeiros mundos distantes a incorporar esta lista foram principalmente planetas gigantes, semelhantes mas também muito diferentes em muitos aspectos de Júpiter e Saturno.

Os astrofísicos já começaram a obter dados sobre as atmosferas dos exoplanetas, mas questões fundamentais sobre a atmosfera do maior planeta do Sistema Solar ainda não foram respondidas. Para entender o que acontece nas nuvens e nas camadas de ar de Júpiter, é necessário estudá-lo ao longo do tempo, em observações contínuas. Agora, pela primeira vez, um instrumento desenvolvido para encontrar e analisar mundos a anos-luz de distância, os exoplanetas, foi apontado para um alvo no Sistema Solar, a 43 minutos-luz de distância da Terra: o planeta Júpiter.

Console de controle do espectrógrafo ESPRESSO

Consola de controlo do espectrógrafo ESPRESSO, durante a observação de Júpiter com um dos telescópios do VLT, no Observatório do Paranal, no Chile. Crédito: Pedro Machado.

Utilizando o Espectrógrafo ESPRESSO

Investigadores do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (Portugal) (Ciências ULisboa), utilizaram o EXPRESSO espectrógrafo instalado no VLT telescópio no Observatório Europeu do Sul (ISSO) para medir a velocidade do vento em Júpiter. Os resultados já foram publicados na revista científica Universo.

O método desenvolvido pela equipe é chamado de velocimetria Doppler e é baseado na reflexão da luz visível do Sol pelas nuvens na atmosfera do planeta alvo. Esta luz refletida é curvada em comprimento de onda proporcionalmente à velocidade com que as nuvens se movem em relação ao telescópio na Terra. Isso fornece a velocidade instantânea do vento no ponto observado.

Pedro Machado

O investigador Pedro Machado, do IA e Ciências ULisboa, está ao lado dos quatro telescópios do VLT (ESO) no Observatório do Paranal, no Chile. Crédito: Pedro Machado

O método agora utilizado com o ESPRESSO foi desenvolvido pelo grupo de investigação de Sistemas Planetários do IA, com outros espectrógrafos, para estudar a atmosfera de Vênus. Os investigadores têm medido os ventos deste planeta vizinho e têm contribuído para a modelação da sua atmosfera geral há vários anos. Agora, a aplicação exploratória deste método com um instrumento “topo de gama” como o ESPRESSO resultou num sucesso que abre novos horizontes ao conhecimento da nossa vizinhança cósmica. Este trabalho afirma a viabilidade de monitorar sistematicamente as atmosferas mais distantes de planetas gasosos.

Metodologia e Observações

Durante cinco horas, em julho de 2019, a equipa apontou o telescópio VLT para a zona equatorial de Júpiter, onde as nuvens leves se localizam a maior altitude, e para as cinturas equatoriais norte e sul deste planeta, que correspondem ao ar descendente e que forma faixas de nuvens escuras e mais quentes em uma camada mais profunda da atmosfera.

Zonas de tempestade de Júpiter

Imagem de Júpiter obtida pela sonda Juno da NASA em maio de 2019, onde são visíveis zonas de tempestade no hemisfério norte do planeta. Crédito: Imagem aprimorada por Kevin M. Gill (CC-BY) com base em imagens fornecidas como cortesia da NASA/JPL-Caltech/SwRI/MSSS.

“A atmosfera de Júpiter, ao nível das nuvens visíveis da Terra, contém amoníaco, hidrossulfureto de amónio e água, que formam as distintas faixas vermelhas e brancas”, diz Pedro Machado, do IA e Ciências ULisboa, “As nuvens superiores, localizadas em na zona de pressão de 0,6 a 0,9 bar, são feitos de gelo de amônia. As nuvens de água formam a camada mais densa e mais baixa e têm maior influência na dinâmica da atmosfera”, acrescenta o pesquisador.

Desafios e Inovações em Pesquisa

Com o ESPRESSO, a equipe conseguiu medir ventos em Júpiter de 60 a 428 km/h com uma incerteza inferior a 36 km/h. Estas observações, aplicadas com um instrumento de alta resolução a um planeta gasoso, têm os seus desafios: “Uma das dificuldades centrava-se na ‘navegação’ sobre o disco de Júpiter, ou seja, saber exactamente para que ponto do disco do planeta estávamos a apontar, devido à enorme resolução do telescópio VLT”, explica Pedro Machado.

“Na pesquisa em si, a dificuldade estava relacionada ao fato de estarmos determinando ventos com precisão de alguns metros por segundo quando a rotação de Júpiter é da ordem de dez quilômetros por segundo no equador e, para complicar, por ser um planeta gasoso, e não um corpo rígido, gira em velocidades diferentes dependendo da latitude de o ponto que observamos”, acrescenta o pesquisador.

Sala do Observatório do Paranal, no Chile

Sala do Observatório do Paranal, no Chile, onde são recebidas imagens do VLT e dados do espectrógrafo ESPRESSO. A observação inédita de um objeto do Sistema Solar – Júpiter – com este espectrógrafo, concebido para observar planetas pelo menos cem mil vezes mais distantes, atraiu o interesse de outros astrofísicos e técnicos presentes. Crédito: Ruben Gonçalves

Para verificar a eficácia da velocimetria Doppler dos telescópios da Terra na medição dos ventos em Júpiter, a equipa também reuniu medições obtidas no passado para comparar os resultados. A maior parte dos dados existentes foi coletada por instrumentos no espaço e utilizou um método diferente, que consiste na obtenção de valores médios da velocidade do vento seguindo padrões de nuvens em imagens capturadas em horários próximos.

A consistência entre este histórico e os valores medidos no estudo agora publicado confirma a viabilidade de implementação da dopplervelocimetria num programa de monitorização dos ventos de Júpiter a partir da Terra.

A monitorização permitirá à equipa de investigação recolher dados sobre como os ventos mudam ao longo do tempo e será essencial para o desenvolvimento de um modelo fiável para a circulação global da atmosfera de Júpiter. Este modelo computacional deverá reproduzir as diferenças nos ventos em função da latitude, bem como as tempestades de Júpiter, para ajudar a compreender as causas dos fenómenos atmosféricos que observamos neste planeta. Por outro lado, o modelo ajudará a preparar observações futuras com informações sobre a pressão e altitude das nuvens na mira do telescópio.

A equipe pretende estender as observações com o ESPRESSO para uma maior cobertura do disco do planeta Júpiter, bem como temporalmente, coletando dados de vento ao longo de todo o período de rotação do planeta, que é de quase 10 horas. Restringir as observações a determinadas faixas de comprimentos de onda também permitirá medir ventos em diferentes altitudes, obtendo assim informações sobre o transporte vertical das camadas de ar.

Uma vez dominada a técnica para o maior planeta do Sistema Solar, a equipa espera aplicá-la às atmosferas de outros planetas gasosos, tendo Saturno como próximo alvo. O sucesso destas observações com o ESPRESSO revela-se importante numa altura em que o seu sucessor, ANDESestá sendo projetado para o futuro Extremely Large Telescope (ELT), também de ISSO e atualmente em construção no Chile, mas também o futuro SUCO missão, desde o Agência Espacial Europeiadedicado a Júpiter e que fornecerá dados adicionais.

Referência: “Dinâmica da Atmosfera de Júpiter Baseada em Espectroscopia de Alta Resolução com VLT/ESPRESSO” por Pedro Machado, José E. Silva, Francisco Brasil, José Ribeiro, Ruben Gonçalves e Miguel Silva, 23 de Novembro, Universo.
DOI: 10.3390/universo9120491



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